Terminada sua primeira edição, o C6 Fest se mostrou de fato um legítimo herdeiro do Free Jazz e do Tim, dois festivais que deixaram sua marca na história recente do mundo cultural brasileiro.

O evento foi na contramão dos grandes eventos do tipo feitos no país, que buscam atrair dezenas, ou centenas, de milhares de pessoas, com inúmeras atrações. A opção por artistas de pequeno ou médio porte, quase todos de qualidade inquestionável, tocando para uma audiência com interesse, mesmo que, em certos momentos diminuída, se mostra acertada.

Problemas existiram: o preço alto dos ingressos afastou muita gente que adoraria ter estado lá, tanto na edição carioca (realizada entre os dias 18 e 20) quanto a paulistana (19 a 21), assim como alguns shows que poderiam ter durado bem mais tempo, incluindo os dos headliners.

O público hoje também é mais eclético e tem tanto interesse em Caetano Veloso quanto no jazz do século 21 do The Comet Is Coming ou no indie rock de primeira do The War On Drugs. Ou seja, a liberação do público para visitar todos os palcos também é algo a ser pensado.
Christine and The Queens
Christine and The Queens (Foto: @c6fest)

Dito isso vamos aos destaques do festival em São Paulo. No primeiro dia, o indie um tanto blasé, do Dry Cleaning ganhou elogios entre os presentes, assim como a sofisticação de Arlo Parks, e a grande atração desta abertura, Christine and The Queens, o show que mais atraiu um público jovem de todo o festival.
Mdou Moctar
Mdou Moctar (Foto: @c6fest)

O segundo dia (20) teve muita black music de primeira na Tenda Heineken, com o tuareg Mdou Moctar colocando a plateia em transe com seus solos de guitarra e o headliner Jon Batiste provando ser um artista completo.
Jon Batiste
Jon Batiste (Foto: @c6fest)

O vencedor do Oscar e do Grammy tocou vários instrumentos, mostrou música inspirada nos sons de Nova Orleans e também muito R&B de pegada clássica. O artista ainda tocou uma exemplar "Tico-Tico No Fubá" ao piano, e realizou o seu desejo de tocar com a cirandeira Lia de Itamaracá na emocionante parte final de sua apresentação.
Kraftwerk
Kraftwerk (Foto: @c6fest)

No palco montado na área externa do Ibirapuera, foi possível se ter uma aulinha de música eletrônica, com Juan Atkins, pioneiro do tecno e o Underworld, representantes da cena inglesa dos anos 90. O destaque maior, claro, foi para os veteraníssimos do Kraftwerk que seguem basicamente com seu show que pouco mudou desde os anos 90, mas que sempre emociona. "Computer World", "Autobahn", "The Robots", "Trans-Europe Express" e "Tour de France" foram alguns dos clássicos do pop que eles relembraram dutante cerca de 70 minutos (infelizmente "Radioactivity" ficou de fora do setlist).
Black Country, New Road
Black Country, New Road (Foto: @c6festival)

O domingo teve os ingleses do Black Country New Road ainda se adaptando à nova formação, mas mostrando uma música instigante e claramente aprovada pelo público bem mais numeroso que o de sábado.

Weyes Blood (na foto que abre esse texto) veio em seguida na mesma Tenda Heineken com suas canções de grande beleza e melodias fortíssimas, e também com a plateia totalmente entregue. O reprtório foi dividio entre as músicas de seus dois álbuns mais recentes, "Titanic Rising" (2019) e "And in the Darkness, Hearts Aglow", do ano passado, ambos muito elogiados pelos críticos.
The War On Drugs
The War On Drugs (Foto: Diego Castanho)

Para finalizar, houve o som hipnótico e magistral do The War On Drugs que, finalmente, estreou no Brasil, depois de mais de uma década sendo celebrada como uma das grandes bandas de nossos tempos. O septeto liderado pelo guitarrista e vocalista Adam Granduciel, tocou 10 músicas em cerca de uma hora e trinta (no Rio foram 16), mas o público certamente não se importaria de ouvi-los por mais alguns (muito) minutos.

Entregando um daqueles shows que quem viu não deve se esquecer, é fácil apostar que agora eles também se tornarão objeto de culto por aqui. Que o retorno não demore,
DOMi & JD BECK
DOMi & JD BECK (Foto: @c6festival)

Muito elogiado também foi o trio de atrações que estiveram no Auditório Ibirapuera: a vencedora do Grammy de revelação deste ano, Samara Joy, que cantou "Flor de Lis", de Djavan e o clássico da bossa-nova "Chega De Saudade" em bom português, a dupla de teens virtuosos Domi and JD Beck e a quebradeira sem limites do ingleses do The Comet Is Coming.

Agora é torcer para que em 2024 o festival volte com atrações tão fortes quanto a desta edição de estreia.

(Leandro Saueia)