Jamila Mafra
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Meu Corpo Arde em Febre

Jamila Mafra


Por favor,
Diga que vocĂȘ me detesta,
Me diga que vocĂȘ nĂŁo me ama
Para que eu possa passar a noite inteira chorando
Enquanto leio os versos fĂșnebres
Do poeta Augusto Dos Anjos.

Eu gosto de drama,
Eu preciso de drama,
Eu respiro o drama,
Eu sou o drama,
DĂĄ-me drama,
Eu gosto de sofrer,
Se nasci masoquista
O que posso fazer?
Por favor,
NĂŁo economize os seus insultos contra mim!
Por favor,diga que vocĂȘ nĂŁo me ama,
Eu preciso desse drama!

Diga que vocĂȘ me acha estranha,
Anormal e insuportavelmente dramĂĄtica!

Por favor,
Diga que eu sou feia e mal-amada!

Por favor,
Me xingue de doente,louca,imatura,neurĂłtica,
Moça pobre latino – americana subdesenvolvida!

Por favor,me xinga,
Pois nĂŁo vivo
Sem ao menos um drama por dia
Com direito Ă  lĂĄgrimas de sangue
E pensamentos sifilĂ­ticos em Miami!

Meu corpo arde em febre
Ansiando o drama
Dos seus sofrimentos e vĂŁs preces.
Minha alma convulsiona
Desejando em ĂȘxtase que vocĂȘ me diga
Que prefere as outras mulheres.

Por favor,
NĂŁo se preocupe comigo,
Eu nĂŁo quero a cura!
Eu quero que a minha doença
Se misture com a sua.
Eu quero que todos os vĂ­rus e microorganismos
Deteriorem os meus ĂłrgĂŁos:
Bexiga,rins,coração,
EstĂŽmago.ovĂĄrios e pulmĂŁo!

Quero sentir intensamente
A dor e o ardor
Dos cortes das cirurgias
Feitas em mim
E ouvir o médico me dizer assim:
“VocĂȘ passarĂĄ sua vida inteira
Na mesa do centro cirĂșrgico
Sentindo meu gélido bisturi
Cortar a sua pele arrancando seus cistos,
E o calafrio da agulha da anestesia
Sendo cravada na sua dorsal espinha.”

Quero ser enterrada viva
E gritar sentindo
Meu corpo morrer de agonia.

Existe alguma lei neste mundo
Me proibindo de ser feliz
Mesmo diante do sofrimento?
Mas ainda que existisse essa lei
Eu nĂŁo a obedeceria,
Quero sorrir de tristeza
E chorar de alegria!
Por favor,
Leia atentamente
Cada verso desta poesia doente!

NĂŁo se preocupe,
Estou muito Ă  vontade
E plenamente acostumada
A ver os homens que amei e que amo
Em suas fotos com seus pares romĂąnticos,
(Ó,suas mulheres amadas!)
Adoro ser torturada
Com essas imagens hilĂĄrias:
Foto pra mim nĂŁo significa nada!

Eu suplico:
Diga que vocĂȘ me detesta,
Diga que vocĂȘ nĂŁo me ama,
Eu preciso desse drama.

Diga que vocĂȘ me acha estranha,
Insuportavelmente dramĂĄtica,
Feia e mal-amada!
Misture a sua doença com a minha
De modo que nunca mais tenha cura,
Quero sentir os dolorosos espasmos dessa tortura;
Para que eu possa passar a noite inteira chorando
Enquanto leio os versos fĂșnebres
Do poeta Augusto Dos Anjos.

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