Tô com vontade de jogar na rua pedaços de dois corpos decepados Mas se quiserem jogo logo embaixo da cama e até quem te ama vai te desprezar Queria ter a coragem pra dizer que o que eu faço no mundo é lavar cadáver Mas se eu descuido e eles descobrem sozinhos o meu caminho não mais existirá Porque eu caminho tão só no mundo e nem que for por um segundo eu queria gritar Porque eu caminho tão sóbrio, tão leve sendo que quem me persegue sempre vai me achar Eu nunca soube desenhar escadas pra subir na vida e acreditar Que eu posso tudo em quem fortalece e que a gente cresce pra depois morrer Cada defunto é um assunto reto ou torto na boca das pessoas Que fazem calúnia com nome alheio e isso é tão feio mas não vai parar A rodovia cheia de pedestre, ninguém espera o dia clarear E a noite chega tão avassaladora que nem mesmo o tempo faz ela parar A escuridão toma conta do mundo e por um minuto eu penso que não há Lugar qualquer que a paz ainda exista, cheio de conquista e de admiração Vencer na vida é cavar a cova pra enterrar o medo de se arriscar Errar na sorte é entregar pra morte o modelo de túmulo pra me cobrir E hoje os sabiás lá na varanda, quando a gente andam, começam a cantar Meu coração é cheio de amargura, não tenho cultura que dirá família Perdi minha razão quando eu entrei, cavei, furei, enterrei a minha própria filha Tantos buracos até hoje perfeitos mas nenhum foi feito pra me enterrar Talvez eu morra e vire alimento pra urubu, pro vento e pros bichos da terra Pra mim a vida é o mesmo que a morte porque tudo nela sempre se encerra Eu sou coveiro, sou trabalhador e eu não sou doutor, tô mais pra sem-terra Sou brasileiro, não sei não senhor quem me batizou nem de onde vim Só sei que um dia vou morrer também mas nunca porém vou ter meu fim Porque eu caminho tão só no mundo e nem que for por um segundo eu queria gritar Porque eu caminho tão sóbrio, tão leve sendo que quem me persegue sempre vai me achar