Amália Rodrigues
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Para Quê Chorar

Amália Rodrigues

Amália / Vinicius


Pra Quê Chorar-Vinicius De Morais
Vinicius de Moraes

Pra quê chorar
Se o sol já vai raiar
Se o dia vai amanhecer
Pra que sofrer
Se a lua vai nascer
É só o sol se pôr
Pra que chorar
Se existe amor
A questão é só de dar
A questão é só de dor

Quem não chorou
Quem não se lastimou
Não pode nunca mais dizer
Pra que chorar
Pra que sofrer
Se há sempre um novo amor
Em cada amanhecer


O Retrato Do Poeta-Ary Dos Santos

Retrato de Alves Redol

Porém se por alguém não sou ninguém
se canto e digo, flor, canção, amigo
a mim o devo. A mim e a mais a quem
floriu nasceu cresceu, lutou consigo

Homem que vive só não vive bem
morto que morre só é negativo
morrer é separar-se de ninguém
e contudo com todos ficar vivo

Nado-vivo da morte. É isso. É isso
Uma espécie de forno de bigorna
de corpo imorredoiro que transforma
em fusão o metal do compromisso
Forjar o conteúdo pela forma
marrar até morrer. E dar por isso


Fado Português-Amália Rodrigues

O Fado nasceu um dia
quando o vento mal bulia
e o céu o mar prolongava
na amurada dum veleiro
no peito dum marinheiro
que, estando triste, cantava
que, estando triste, cantava

Ai, que lindeza tamanha
meu chão, meu monte, meu vale
de folhas, flores, frutas de oiro
vê se vês terras de Espanha
areias de Portugal
olhar ceguinho de choro

Na boca dum marinheiro
do frágil barco veleiro
morrendo a canção magoada
diz o pungir dos desejos
do lábio a queimar de beijos
que beija o ar, e mais nada
que beija o ar, e mais nada

Mãe, adeus. Adeus, Maria
Guarda bem no teu sentido
que aqui te faço uma jura
que ou te levo à sacristia
ou foi Deus que foi servido
dar-me no mar sepultura

Ora eis que embora outro dia
quando o vento nem bulia
e o céu o mar prolongava
à proa de outro veleiro
velava outro marinheiro
que, estando triste, cantava
que, estando triste, cantava


Autogénese-Natália Correia

Nascitura estava
sem faca nos dentes
cómoda e impura
de não ter vontade
de bater nas gentes

Nasce-se em setúbal
nasce-se em pequim
eu sou do açores
(relativamente
naquilo que tenho
de basalto e flores)
mas não é assim
a gente só nasce
quando somos nós
que temos as dores

Pragas e castigos
foram-me gerando
por trás dos postigos
e fórceps de raiva
me arrancaram toda
em sangue de mim

Nascitura estava
sorria e jantava
e um beijo me deste
tu Pedro ou Silvestre
turvo namorado
do verão ou de outono
hibernal afecto
casca azul do sono
sem unhas do feto

Eu nasci das balas
eu cresci das setas
que em prendas de sala
me foram jogando
os mulheres poetas
eu nasci dos seios
dores que me cresceram
pomos do ciúme
dos que os não morderam

nasci de me verem
sempre de soslaio
de eu dizer em junho
e eles em maio
de ser como eles
as vezes por fora
mas nunca por dentro
perfil de uma estátua
que não sou de frente

Nascitura estava
e mais que imperfeita
de ser sorte ou dado
que qualquer mão deita

Eu nasci de haver
os bairros da lata
do dedo que escapa
dos sapatos rotos
da fome que mata
o que quer nascer
e que o sábio guarda
em frascos de abortos

eu nasci de ver
cheirar e ouvir
dum odor a mortos
(judeus enlatados
para caberem mais
mas desinfectados)
pelas chaminés
nazis a sair
de te ver passar
de me despedir
de teus olhos tristes
como se existisses

Nascitura estava
tom de rosa pulcra
eu me declinava
vésper em latim
impura de todos
gostarem de mim


Mensagem - Vinicius

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